I wander around the city and its escapes, discovering the experiences that are worthwhile in a world full of noise.
As a curator of the best of Portugal and sometimes as a World traveller, with more than twenty years of articles published, in the national and international press, and also as an TV Show. author, this is my digital magazine, where I present my curated collection of exquisite life experiences.

Sancha Trindade

Sotão, Do Sótão nasce a luz

No regresso à memória dos sótãos da infância, onde aprendi a criar histórias sobre os objectos do passado, o novo Sótão do Príncipe Real respira o poder da transformação.

‘Sem medo da escuridão’. Por momentos, viajo a um dos livros do Nobel Português – ‘Todos os nomes’, no qual a personagem principal, confusa e cansada, decide não se levantar logo do chão do sótão. E se me pergunto ‘por quantos sofrimentos têm de passar as pessoas que saíram da tranquilidade de seus lares para se meterem em loucas aventuras’, a resposta neste canto delicioso de Lisboa é: nenhum.

Pedro Santos e Luís Bessa já são dois nomes conhecidos na praça mais ousada da cidade, que estoica e visionariamente, tiveram em tempos, no Chiado, uma loja dedicada ao design português. Porque o povo lusitano entende sempre tarde as visões mais lúcidas, o projecto diluiu-se no tempo com a certeza que quem corre por gosto não se cansa.

Mais do que ‘um ensaio sobre a existência ou procura da identidade’, o Sótão é uma loja vintage e um atelier de design que, no mesmo espaço, se projecta com um imenso amor a Portugal pelo destaque aos nomes nacionais, pouco explorado ainda na área do vintage. Mais uma vez visionários, Pedro e Luís, com grande dedicação aos anos cinquenta, sessenta e setenta, dão-nos a escolher entre peças de Damião da Costa, Conceição Silva, José Espinho, ou das fábricas Olaio ou Longra.

Com espaço também para o design francês e italiano, ao fundo respira uma cadeira de Marcel Breuer, um candeeiro da Charlotte Perriand ao nosso lado e uma mesa Castelhoni da Kartell à direita. A conversa cúmplice de quem defende o grande potencial desta cidade tem como morada de abraço o par de sofás de pele, cor de caramelo, de Mario Bellini para a B&B, um dos conjuntos mais apetecíveis do Sótão.

Nos armários, exibem-se cerâmicas alemãs e portuguesas, como as da Secla, e há ainda um espaço para a Yuku, uma marca de carteiras portuguesa que nasceu a partir dos estofos para carros. As flores da jarra que inunda o espaço exibem ainda o brilho da festa do Príncipe Real Live da passada semana, que, inundado de amigos da cidade, tapou o chão do Sótão com muitos pés curiosos.

Como exemplo da criatividade que o país tanto precisa, este novo espaço transpira respeito à transmutação, que com cento e cinquenta anos de existência foi escovado e mantendo a sua patine intacta. Respiro fundo sempre que assisto ao respeito da preservação da minha cidade e se, aqui, mesmo com cadeiras que voam no espaço, ninguém é louco no labirinto das linhas de Saramago, as histórias que saem deste Sótão, são histórias simples. Histórias que caminham com os pés bem assentes no chão, sempre em direcção a um futuro onde há só tempo para uma chamada. A de continuar a existir.

crónica publicada a 15 de Dezembro de 2011 na Vogue

Sotão
Pátio do Tejolo, 1 à Rua Dom Pedro V, Lisboa
Tel . 915 695 737
www.sotao.com.pt
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Qua Sex 14h – 20h e Sáb 11h – 20h
(horário especial de Natal Seg a Sex 14h – 20h e Sáb e Dom 11h – 20h)