I wander around the city and its escapes, discovering the experiences that are worthwhile in a world full of noise.
As a curator of the best of Portugal and sometimes as a World traveller, with more than twenty years of articles published, in the national and international press, and also as an TV Show. author, this is my digital magazine, where I present my curated collection of exquisite life experiences.

Sancha Trindade

João Tordo nomeado para um prémio europeu

Costumo chamar ao João, o homem luz. Da sua literatura viciante, O Bom Inverno está pré-seleccionados ao Prémio do Livro Europeu, organizado pela associação Esprit d’Europe. A edição francesa da obra, traduzida por Dominique Nedellec e publicado pela Actes Sud. Na sua sexta edição o jurí é composto por jornalistas de vários países da União Europeia, todos eles correspondentes em Bruxelas, e este ano tem como presidente o realizador grego Costa-Gavras.

‘Quando o narrador, um escritor prematuramente frustrado e hipocondríaco, viaja até Budapeste para um encontro literário, está longe de imaginar até onde a literatura o pode levar. Coxo, portador de uma bengala, e planeando uma viagem rápida e sem contratempos, acaba por conhecer Vincenzo Gentile, um escritor italiano mais jovem, mais enérgico, e muito pouco sensato, que o convence a ir da Hungria até Itália, onde um famoso produtor de cinema tem uma casa de província no meio de um bosque, escondida de olhares curiosos, e onde passa a temporada de Verão à qual chama, enigmaticamente, de O Bom Inverno. O produtor, Don Metzger, tem duas obsessões: cinema e balões de ar quente. Entre personagens inusitadas, estranhos acontecimentos, e um corpo que o atraiçoa constantemente, o narrador apercebe-se que em casa de Metzger as coisas não são bem o que parecem. Depois de uma noite agitada, aquilo que podia parecer uma comédia transforma-se em tragédia: Metzger é encontrado morto no seu próprio lago. Porém, cada um dos doze presentes tem uma versão diferente dos acontecimentos. Andrés Bosco, um catalão enorme e ameaçador, que constrói os balões de ar quente de Metzger, toma nas suas mãos a tarefa de descobrir o culpado e isola os presentes na casa do bosque. Assustadas, frágeis, e egoístas, as personagens começam a desabar, atraiçoando-se e acusando-se mutuamente, sob a influência do carismático e perigoso Bosco, que desaparece para o interior do bosque, dando início a um cerco. E, um a um, os protagonistas vão ser confrontados com os seus piores medos, num pesadelo assassino que parece só poder terminar quando não sobrar ninguém para contar a história’.

A chuva caíra toda a noite, mas a noite ainda não chegara. Nessa tarde regressei à casa debaixo de um temporal tão denso que obscureceu o caminho do bosque em meu redor, o céu invisível escondido pela água torrencial que se derramava das copas das árvores. O bosque mergulhara numa intensa escuridão e eu mergulhara nele. Quis correr, nunca desejei tanto poder correr; mas, como nos pesadelos em que não saímos do mesmo sítio, consegui pouco mais do que arrastar o meu corpo debilitado, apoiado na bengala, pela lama do caminho. Coxeei pelo bosque fora, grunhindo, desesperando, o cabelo escorrendo a água da chuva, a roupa colada ao corpo, o braço livre afastando com violência os ramos das árvores chorosas que me barravam o caminho. O meu esforço foi tão grande que as lágrimas de dor rapidamente se transformaram num riso de escárnio, e ri-me da minha figura trôpega a meio de um temporal, e ri-me de raiva, e ri-me do suor que me jorrava pelas têmporas, e ri-me do mundo e do que estava para lá do mundo, e ri-me dos deuses que pareciam zombar da minha lentidão. O Inverno chegara, afinal;’