I wander around the city and its escapes, discovering the experiences that are worthwhile in a world full of noise.
As a curator of the best of Portugal and sometimes as a World traveller, with more than twenty years of articles published, in the national and international press, and also as an TV Show. author, this is my digital magazine, where I present my curated collection of exquisite life experiences.

Sancha Trindade

‘Eu sou português’ por Maria de Lurdes Vale

Sou português…

…sou assim, ou em forma de assim, assim disse o O’Neill. Sou nostálgico, pessimista, risonho e reservado. Um poeta que versa ao despique ou chora o triste fado. Canto para espantar males, chamo porreiro a quem me encanta, olho desconfiado para quem está bem. Vivo no mundo, no da terra e no dos sentidos, habito um território com 866 anos de história, fruto da determinação de quem por cá passou…e ficou.

Sou lusitano, celta, visigodo, grego, latino, islâmico, hebraico, romano, cristão, filho de cavaleiros e cruzados, de monges e abadessas, de oradores, defensores, lavradores, pescadores, oficiais, físicos, cirurgiões, mareantes, tangedores, armeiros, ourives, de reis, de republicanos, anarcas, regeneradores, ditadores, democratas e homens e mulheres livres. Sou patriota, jogo totoloto, euromilhões, tomo a bica ou o café e uso jeans. Expresso-me em português, a sexta língua mais falada no mundo, mas nem todo o mundo o sabe, gosto de futebol, gosto muito de futebol, vejo a pátria no ecrã, desespero com facilidade, lembro de quando em vez a gesta de Camões, vejo sombras e decadência. O que é isso do V Império?

Sou um estado de espírito. Pergunto se está tudo bem e respondo vou andando, dói-me tudo, a cabeça, as costas, é um peso que tenho, nada nem ninguém me facilita a vida, vejo mais telenovelas e dificuldades do que oportunidades. Queixo-me. De mim, dos outros, do destino, da crise, da troika. Mas naveguei a ver estrelas, desbravei ondas, inventei velas e aportei em ilhas e continentes. Passei por lá, também fiquei por lá e lá deixei o nome, a língua, a pátria, Deus e a autoridade. Sou um estado de alma. Sou saudade. Sou a força da natureza, a invenção, a criação, o desenrascado.

Sou D. Dinis, D. Sebastião, Dona Maria e Marquês. Sou Nuno Álvares, batalhador, um contra mil, uma espada e um cavalo. Sou Pessoa, Malhoa, Antero, Bordalo, Herculano, Garrett, Eça, Cesário, Sena, Cesariny, Andrade, Siza, Souto e tantos outros bons que há e desconheço porque também sou Ronaldo e Mourinho. Sou o que diz e não faz. O que quer ser pontual mas nunca chega a tempo. Sou de uma terra de azeite, vinho, sal, da flor de sal, da madeira, lã, burel e lenha. Da alheira, da broa de avintes, das conservas. Sou do campo, do bosque, da cidade, da vila, de atrás dos montes e dos Algarves.

Sou do Mar e da mina, mas é no mar que perco o olhar. Confesso-me a Deus e à Virgem, sou peregrino de Fátima, de outros caminhos e de outras fés. Tenho o paladar salgado, o olhar doce, a voz quente e um ou dois beijos para cada cara. Não gosto de perder a face, nem a da terra, nem a minha. Sou alto, sou baixo, de olhos pretos, castanhos e esverdeados, em forma de amêndoa ou de azeitona, boca carnuda, sobrancelhas carregadas e cabelos ondulados. Sou uma mistura de bom senso e exuberância, capaz de grandes feitos e profundas derrotas. Sou Fernão Lopes e Bandarra, Gil Vicente e Bocage, faço levantamentos e revoluções, cordões, sapatos e rolhas. Sou os quatro elementos, sou como Sophia. Sou um viajante, um mago, um aventureiro, uma cantiga, um amigo. Sou de onde a terra acaba e o mar começa. Assim sou. Um empreendedor de emoções, uma alma sem par.

texto de Maria de Lurdes Vale – Vogal do Turismo de Portugal – publicado no Diário de Notícias

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