Não, não é novo na cidade, mas o esconderijo bem guardado merece a minha generosa partilha. Jamais poderia ser uma boa referência na arte de aconselhar, se não elegesse nestas linhas uma das salas de jantares preferidas da minha Lisboa mais autêntica.
Numa das travessas das ruas da Bica, a estrela ilumina a cidade com um enorme sentido de cidade viva. À média luz e num ambiente que me é familiar, pelos livros mal arrumados e escondidos nos lugares mais recônditos, esta morada privilegia-me pela energia pura que me incendeia.
A estas quatro paredes levo apenas a quem reconheço o sentido de existência, que na beleza dos corações mais puros, conseguem estar inteiros nesta hora tão sagrada que é a partilha de um fim de dia.
O verde água das divisórias transporta-me às mais luminosas memórias de criança e os objectos vintage lembram-me os armazéns que, em tempos, percorria como criança com o homem das mãos de veludo. Há publicidades antigas que revelam um amor maior, garrafas do tempo dos pirolitos, e um relógio que aguarda encontros dos desconhecidos da Europa.
A carta atende a todos os meus caprichos, não apenas com o Guacamole, mas com o Tzatsiki ou o Hummus, sempre com ingredientes impossíveis de comprar nos mercados de uma grande superfície. Na cozinha, o Riki e o Hugo fazem magia e nas suas últimas experiências, com nota vinte para a Perca com crosta de azeitona sobre cama de legumes à Brás. Todos os dias, há três pratos diferentes (nesse dia havia a opção de mousaka vegetariana e rolinhos de frango com farinheira) e muitas entradas e petiscos como manda uma experiência tão calorosa como esta.
Na excepção da condição rara da beleza com que vivemos, há ainda a entrega da Natália a uma língua que não é a sua e o sorriso suave e doce da Cris, que além da beleza portuguesa, ainda consegue fazer o melhor tiramisu de Lisboa.
Nas paredes, há promessa de morangos com chantilly e fotografias que me confirmam que ‘You’ll never know until you try it’. Do passado, há cartas de amor coladas ao redor e, do futuro, há a certeza que, perante o encontro de um rosto, há a esperança de habitar um mundo maior.
crónica publicada a 27 de Outubro de 2011 na Vogue
Estrela da Bica
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