I wander around the city and its escapes, discovering the experiences that are worthwhile in a world full of noise.
As a curator of the best of Portugal and sometimes as a World traveller, with more than twenty years of articles published, in the national and international press, and also as an TV Show. author, this is my digital magazine, where I present my curated collection of exquisite life experiences.

Sancha Trindade

João Tordo, o ‘Saramago’ de 2009

‘Não sei dizer exactamente porque o fiz. Talvez porque a literatura, coisa extraordinária e impossível de explicar (e justamente por isso alvo de constantes e frustradas tentativas), tinha sido uma jovem ambição que cedo se transformara numa fonte de mal-entendidos. Fosse porque não acreditava em mim próprio, fosse precisamente pela razão contrária – porque, no fundo, me julgava capaz de coisas extraordinárias – tomei a decisão de, após muito tempo a fazer aquilo a que normalmente chamamos ‘ganhar a vida’, renunciar a essa flagrante perda de tempo e fechar-me em casa a escrever a obra com que, finalmente, me vingaria do mundo.’

Estas são algumas das palavras do novo romance que de João Tordo, vencedor da sexta edição do Prémio Literário José Saramago com o seu romance ‘As Três Vidas’. Nascido em Lisboa em 1975 e formado em Filosofia pela Universidade Nova, um metrado em jornalismo em Londres ou um curso de escrita criativa no City College, Nova Iorque,  conversei com o oescritor  dias antes do seu mês passado na Ledig House International Writers Residency nos Estados Unidos. A residência já albergou, em doze anos, centenas de escritores de mais de 50 países espalhados por todo o Mundo e João Tordo refugiou-se para escrever a convite do Instituto Português do Livro e das Bibliotecas.
© Daniel Mordzinzki

O prémio Saramago foi uma surpresa?
Não há muitos escritores com três romances publicados antes dos trinta e cinco anos. Eu já tinha tido muitos boas críticas por isso partilho que foi uma surpresa, mas não muito grande.

Qual a sensação?
Fiquei radiante, pois podia estar um ano um ano e meio só a escrever. Já só passaram seis meses e tenho o novo romance concluído e isso seria muito difícil de acontecer se eu estivesse num emprego das nove às cinco.

O prémio Saramago mudou a tua vida?
Não… e não fiquei uma pessoa diferente, nem fui viver para uma ilha tropical (risos). A única coisa que mudou foi a capacidade de negociar com as editoras.

Mas depois do prémio foste convidado para a ‘Ledig House International Writers Residency’, perto de Nova Iorque…
Não tem nada a ver com o prémio, porque esse convite do IPLB surgiu antes do prémio. Este ano fui o único português a ser convidado para essa residência de escritores e o convite não foi surpreendente dado o número de obras que tenho publicado. O Instituto Português do Livro e das Bibliotecas que tem acordo com a casa escolheu-me antes do prémio por isso são distintas.

E podes partilhar alguma coisa sobre o teu novo romance, o ‘Bom Inverno’?
A história tem a ver com uma viagem que eu fiz no ano passado, a Budapeste a uma convenção de novos escritores europeus. Nesses dias conheci um escritor italiano, o Vincenzo de quem fiquie muito amigo. Depois do encontro surgiu um convite para passar alguns dias de Verão a Sabáudia, a Sul de Roma, uma vila com muita história junto à praia.Mandada construir nos tempos do fascismo pelo Mussolini – no começo chegou até a chamar-se Mussolinia – a sua arquitectura muito geométrica e fascista veio a ser uma estância de férias, de grandes nomes do cinema e da música e das letras como o exemplo de Pasolini ou de Alberto Moravia. Era uma estância de intelectuais que depois da queda do fascismo começaram a comprar casas em Sabáudia, por ser  vila cheia de história junto às praias. Estas duas coisas combinadas começaram a germinar uma história que nada tem a ver com estas pessoas mas que se passa por estes dois lugares, em Budapeste e em Itália. Este livro nada tem a ver com os meus anteriores romances, pois é um livro mais rápido, muito cinematográfico, pois a própria Sabáudia tem a ver com o cinema e eu quis que fosse uma história pessoal mas ao mesmo tempo um puro e duro. Toda a história gira à volta de um homem morto e das personagens que estão numa casa e que não podem sair enquanto não se descobrir quem foi o autor do homicídio.

Há muita genialidade nos teus romances… por isso estão muito curiosa sobre o teu novo livro. Entrando nos valores da Chivas, qual a decisão mais certa que tomaste na tua vida?
A decisão mais certa foi ter decidido que a certa altura tinha de começar a escrever, como escritor. Eu fui jornalista desde os 21 anos e fui até correspondente em Londres e Nova Iorque e foi na cidade que nunca dorme de que decidi ser romancista. Só mais tarde me percebi que era uma coisa que eu gostava mesmo de fazer, e por isso foi sem dúvida a decisão mais certa da minha vida.

Como é que a Honra entra na tua vida?
A Honra é um conceito que vais assimilando e dando mais valor ao longo da vida. Os meus livros têm sempre personagens mais velhas que são também imagem disso e que são pessoas que já passaram e viram tantas coisas, ou que já perderam tanto, que sabem profundamente dar valor a tudo o que construíste. A Honra acaba por ser também uma maneira de se ser honesto, de ser leal e solidário.

Raro nos dias que correm…
O mais importante é sermos sinceros. Já fiz muita coisa de que não me orgulho, mas isto faz parte da nossa condição de humanos. E das duas uma ou tu tens aquela honra japonesa em que tens de fazer tudo bem na vida, senão ‘arakiri ‘(matas-te), a honra dos samurais, ou então… hoje em dia nós somos exactamente o contrário.

Eu gosto de levar uma vida com valores, só é possível ser inteiro assim… qual é um dos valores mais forte s na tua vida?
A amizade, sem dúvida. Sou muito amigo dos meus amigos.

Na campanha ‘live with Chivalry’ tu vês isso, aquela amizade inquebrável entre os homens… Serão os homens mais amigos dos homens do que as mulheres das mulheres?
A amizade dos homens é menos ingrata ou se quiseres, menos traiçoeira. Tendo a achar, e posso estar enganado, que as mulheres são mais competitivas em relação aos homens. Os homens são mais companheiros.

Já alguma vez mudaste a tua vida 180°?
Por momentos achei que ias dizer 360° (risos)

Não, eu sou uma mulher de palavra e de palavras, mas tenho conhecimentos matemáticos… (risos)
Sim já mudei o rumo algumas vezes na minha vida. Quando fui viver para Londres, quando fui para Nova Iorque com uma mochila às costas. Das vezes que me despedi, com a coragem de ir em busca da felicidade. São decisões que te tornaram num ser humano mais honrado. Aí está a Honra da qual falávamos à bocado… respeitar o nosso instinto ajuda.

Ouvir a tua voz interior… a importância das escolhas. A essência continua lá mas tu és agente de mudança?
Sim, sem dúvida, daí achar a ideia de mudança de 180° ser um bocado radical. Tudo o que muda são coisas que estão fora de ti.

Gostas de ser frontal com as pessoas?
Depende com quem…

Mas eu vejo-te com um ser humano bastante frontal…
Mas isso porque tu abres-me a janela a que seja, pois és uma pessoa bastante frontal (risos). Emocionalmente gosto de resguardar a fragilidade dos outros. Raramente tenho necessidade de dizer muitas verdades, aliás tenho a mais-valia de ser bastante fácil perdoar e aceito bem a opinião dos outros. Dou muito valor à paz de espírito.

Onde é que tu encontras a tua maior liberdade?
A resposta óbvia seria dizer-te que é quando escrevo, mas nem sempre é assim pois também a escrita nos prende, nem que seja pelas obrigações dos prazos. Gozo a liberdade nos momentos em que supero os meus objectivos. Eu tendo a achar que toda a liberdade, todo o prazer é alívio. Pode ser peculiar, mas nem sempre vejo o copo meio cheio. Tenho o vício de viver a fazer planos B, antes do plano A acontecer (risos). O facto de eu compreender isto, já revela por si uma vontade de mudança e ainda mais maturidade. Ou quando sinto que um fracasso é um passo para uma coisa melhor.

Dás-me um exemplo?
Sim. Dos sete romances que eu escrevi, apenas três foram publicados, e todos eles deram-me a luz para onde ir. Foi uma enorme liberdade depreender-me deles e aceitar que não foram mais do que um caminho para começar do zero e fazer melhor, percebendo o que não queres voltar a afazer. Isto aplica-se a tudo, livros, pessoas, ou a decisões de vida. Sempre que o romance me sai bem tenho uma sensação enorme de liberdade.

Podes partilhar algum acto bravo da tua vida?
Ainda no noutro dia, um dia de muito calor, a descer a Infante Santo cruzei-me com uma senhora de idade, cega e que estava perdida a tentar encontrar uma casa. Andei com ela mais de duas horas com a senhora que nem falava bem português pois tinha um sotaque cerrado das beiras, se é bravura não sei, mas a ideia de ajudar o próximo numa altura de apuros é muito forte para mim, vou sempre ajudar.

Gosta de ser cavalheiro?
Gosto e sou. Gosto de ser cordial e de tratar bem as mulheres. Mas cavalheirismo não tem só a ver com mulheres, tem a ver com toda a gente. Não sou capaz de ser mal-educado, está-me no meu sangue.

Com o fígado ou com o coração? *
(risos)… andaste no meu blog

Sim e a gostei muito do excerto que lá puseste do Silverio Lanza…
A frase é um bocado dúbia e tem como plano de fundo um homem que está alcoolizado a tentar explicar que gosta de alguém, só que a parte do corpo que ele sente é o fígado não é o coração. Muitas vezes amamos com o fígado, mas é uma mais valia amarmos com o coração.

Quais são os teus momentos mais ‘chivalry’?
Estás-me a perguntar se eu sou um cavaleiro dos tempos modernos? (risos) Eu acho que o forte da campanha ‘live with chilvary’ tem a ver com a amizade. Eu tenho o privilégio de ter grandes homens da minha vida, e que são pessoas raras e que não encontras todos os dias. Se eu pudesse imaginar-me na cena do anúncio em que vês os homens a saltar do pontão, eu estou a ver a cara dos meus amigos que fariam parte desse grupo. Em certo sentido e não havendo boémios como Hemingay ou Joyce, já não há uma geração boémia como havia nos anos sessenta ou setenta como o José Cardoso Pires. Os escritores hoje em dia são também um produto profissional e isso não é a imagem real do homem por trás dos dedos. Eu gosto da ideia da pessoa que se mostra inteira com as suas vitorias e fragilidades.

Estás a falar do marketing pessoal…
Sim e esse marketing está a mudar as pessoas reais. Um escritor não é uma marca registada. Não nos levarmos tão a sério e pensarmos que temos de estar protegidos por trás de uma máscara constante. Ser escritor não é uma profissão, é uma vocação. Nesse sentido gosto de ser despretensioso e felizmente eu tenho isso com os meus amigos, muitos deles escritores. Sou um afortunado.