Há um sentimento sagrado que me envolve sempre que chego à estação de Santa Apolónia. De manhã cedo, enquanto os ardinas modernos reconstroem as suas bancas, chego à estação que me leva ao Porto estrondoso. Há muito que já não perco a passagem das horas nas estradas de asfalto. E deixando-me abraçar pelo Tejo, que respira em frente, a pulsação nasce nas plataformas. E piso o cais de embarque como um lugar sagrado, onde os encontros e distâncias elevam-se a momentos mais acesos, lugares de paixão perfeitos para a evolução da escrita.
São tempos onde aproveito para refletir. E nas carruagens sagradas por todo o movimento do mundo que me é dado através das janelas, consigo recolher sempre um regresso à essencialidade daquilo que somos. Enquanto seres que se movem, que amam, que se deixam amar, que fazem parte de um povo e de uma missão, a missão do que nos faz alcançar um outro lugar. Os corpos movem-se e com eles o mundo lá fora o reflexo da importância do tempo.
Na viagem abro-me sempre a um estado maior, tudo o que trago cá dentro. Desde sempre, que me identifiquei com o rasgo do norte e pelo empreendedorismo associativista. Talvez por isso, as pessoas do Porto estão mais preparadas para este tempos frágeis que mesmo acorrentados à palavra ‘crise’ – tenho visto muitas coisas boas nesta palavra – não se deixam abater. Talvez porque na pele de um homem não se deixam consumir pela fragilidade dos dias.
Talvez seja mesmo isso que a vida nos pede a todos nós. Para vivermos na beleza do presente, não num futuro que hoje se mostra tão incerto. E por essa presença, pelo movimento com imagens cenicas que nem ouso fotografar, não há dúvidas quando me deixo transportar pela vida.
De cidade em cidade, de projeto em projeto. Sem nunca perder o eixo, sem nunca perder o compasso do que cada um de nós vem percorrer na passagem das horas.
por respeito ao tempo, ao seu, ao nosso, ao dos outros entre na carruagem aqui.
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