I wander around the city and its escapes, discovering the experiences that are worthwhile in a world full of noise.
As a curator of the best of Portugal and sometimes as a World traveller, with more than twenty years of articles published, in the national and international press, and also as an TV Show. author, this is my digital magazine, where I present my curated collection of exquisite life experiences.

Sancha Trindade

‘Perfeccionista, audaz e exigente’ o chefe e empresário José Avillez, com apenas trinta anos de idade, alcançou uma estrela Michelin, o garfo de platina do Jornal Expresso e é o Chefe do Ano pela Academia Portuguesa de Gastronomia. Considerado a Personalidade do Ano pela Gastronomia na Revista Wine, está ainda presente na edição da Phaidon, ‘Coco: 10 World-Leading Masters Choose 100 Contemporary Chefs’. Além de chefe executivo no Tavares, é consultor, supervisiona a José Avillez Catering e a marca JA que engloba o JA à mesa e o JA em casa, um serviço de take-away disponível em Lisboa e Cascais.

Pela sua história e carisma, o Tavares Rico é uma morada emocional, enquanto lugar onde testemunhas dias especiais da vida dos teus clientes?
(sorriso) Isso era bom se tivéssemos um mercado maior. Felizmente tenho clientes semanais.
 
Mas a estrela Michelin mudou o Tavares Rico…
Tivemos uma imediata afluência de portugueses, pela mediatização da estrela e depois de estrangeiros, com um crescimento de 40%.

Além da estrela foste também considerado Personalidade do Ano na área da Gastronomia na Revista Wine? Estavas à espera deste prémio?
Mais do que o reconhecimento, ambos os prémios dão-me responsabilidade acrescida.

És muito novo para tantos prémios. O que há mais para ganhar?
A minha vida não é só o trabalho. (risos) Além do Tavares tenho ainda a JA e a José Avillez Catering que ocupam algumas horas do meu dia, entrevistas, palestras onde partilho as minhas experiências e conhecimentos.

Partilhar é importante?
É muito importante divulgar o que estamos a fazer.

Porque o fizeram contigo?
Mais importante do que a minha carreira, a importância da divulgação do nome de Portugal. Basta olhar para o Ferran Adrià que já deu onze mil entrevistas, sempre a divulgar a alta cozinha espanhola. Se estamos a inovar, mas ninguém conhece… a partilha é fundamental. E como chefe português sinto também a responsabilidade de divulgar o nome do meu país.

Ferran Adrià marcou a tua assinatura?
Não tanto a assinatura técnica, mas a conceptual. Marcou-me ao nível da paixão com que faço tudo e o gosto de querer sempre mais. Também a percepção de que a cozinha deve ser emocional. Nos mandamentos que acompanham a minha cozinha, o mais importante é o sabor, que faz com que todos os pratos nasçam de um lado emocional.

Isso é bonito…
(sorriso) A nova cozinha foi iniciada pelos chefes Ferran Adrià, Michel Bras, Andoní Luis Aduriz, entre outros nomes que me influenciaram. O lado emocional mais artístico existe num prato de uma cozinha que transmite algo mais, do que apenas só os sabores que se podem tirar nele.
 
Tal como o romance ‘Como água para chocolate’ de Laura Esquível, o amor com que se cozinha sente-se no prato?
Sente-se claro. Mas como na música ou em outras artes, há dois tempos muito importantes na cozinha, que são a composição e a criação do prato. O autor transmite a alma e os sentimentos para o que está a fazer, mas há ainda a interpretação. Como numa orquestra, os sentimentos de um músico também transparecem, todos os dias o prato cozinhado, tem de ser interpretado o mais parecido como se compôs na primeira vez, independente dos sentimentos com que o chefe tenha acordado nesse dia. Com essa dedicação, oiço muitas vezes dos meus clientes ‘isto lembra-me mesmo a minha infância’…

Agora lembraste-me o filme do ‘Ratatui’…
É um dos mais fiéis filmes feitos sobre cozinha.

A tua cozinha segue-se pela ‘técnica, criatividade e espírito inovador’. A essas qualidades acrescentas então a emocionalidade?
Sim, mas chamar-lhe-ia técnico-emocionalidade. A nova revolução culinária, que define a década dos anos 90, início de 2000 é apanhar alguns conceitos da ‘nouvelle cuisine’ e os seus mandamentos. Mas há esta parte mais emocional que é a técnica, que existe na cozinha para despertar emoções no chefe e no cliente. No caso dos meus pratos do Tavares – e há vários autores que falam disto, mesmo até em termos poéticos ou de psicanálise – muitos representam paisagens como ‘a paisagem alentejana’ ou ‘a horta das galinhas dos ovos de ouro’, como momentos de intersecção com os sentidos virados para a paisagem e com o cruzamento do que a nossa alma vê, como pratos expressionistas. No impressionismo os pintores pintavam o que viam, no expressionismo o autor tem uma relação mais directa, porque a interpretação do que vê é feita com base no que está a sentir. Esta interacção faz com que nasça um novo mundo, cheio de novas emoções.
 
Tal como acontece quando vemos um filme…
Exactamente. Por isso é que é uma experiencia diferente conforme a tua idade, se tens dez, trinta ou cinquenta anos… Há muita diferença que tem a ver com a memória, com o passado e com as experiência que vais acumulando.
Eu penso na criação do prato também como um conjunto de garfadas, ou seja, cada garfada é uma experiência que tem de ser vivida como um movimento. Quando comemos um Bacalhau à Brás já sabes que a primeira garfada será igual à última. Nos pratos do Tavares isso não acontece, pois os pratos são criados a pensar na experiencias de várias sensações.
 
Uma cozinha ‘viajante’…
Sim…por um lado pelas influências que vou tirando das viagens, por outro, quando comemos viajamos pelas sensações. Dou-te o exemplo de um robalo escalfado a uma determinada temperatura que já foi experimentado aqui no Tavares, por mais de dez pessoas, dos quatro cantos do mundo. Todos me disseram que ‘isto é mesmo um mergulho no mar’. Há uma teoria para além da técnica e para além do sabor: ‘serve-me o que fazes e dir-te-ei quem és’. O diálogo comensal é a nossa cozinha.

Foi uma surpresa para ti fazeres parte da edição da Phaidon, ‘Coco: 10 World-Leading Masters Choose 100 Contemporary Chefs’?
Foi uma surpresa…e foi muito importante para mim mas também muito importante para Portugal. Infelizmente nós portugueses vivemos muito separados, não há uma força conjunta que puxe Portugal para cima.

Imagem… sempre achei que tiveste sempre muito cuidado e geres a tua imagem muito bem. Marketing pessoal é sinal de inteligência?
Em 1970 o chefe francês Paul Bocuse foi acusado por ter saído muito da cozinha e ter aparecido nas revistas, televisões e nos jornais. Ele respondia sempre com uma frase que comprovava a sua dedicação também à cozinha: ‘Todos os domingos tenho de fazer soar os sinos da Igreja para as pessoas se lembrarem de ir à missa’.
 
Mas tens tido sempre muito cuidado com a tua imagem… (felizmente) nunca abriste a porta da tua casa.
Sim, nem pensar expor a minha vida privada.

Sobre os valores do Chivas Club, como é que a Honra se define na tua vida?
Acreditar naquilo que faço, com a consciência de não ir contra os meus valores. Honrarmo-nos a nós próprios para sermos honrados exteriormente. O que partilho em casa é o que transmito no trabalho. Dá-me prazer que as pessoas que estão comigo aprendam e cresçam como profissionais. Eu tenho muito miúdos novos na cozinha e tento transmitir tudo o que aprendi na vida. Um dos meus projectos é abrir uma escola de cozinha.
 
Ainda sobre os valores do Chivas Club, qual o gesto mais cavalheiresco da tua vida?
Não tenho nenhum específico, porque não o vejo como um acto heróico, mas antes como intrínseco à minha realidade enquanto homem. A igualdade de direito nas mulheres é bom, mas espero que essa igualdade não faça perder os valores básicos do cavalheirismo dos homens.

E a decisão mais certa que tomaste na tua vida?
Ter vindo para o Tavares. Na altura, apenas quatro pessoas – a minha mulher Sofia, o chefe Bento dos Santos, a Maria de Lourdes Modesto e a minha irmã – me apoiaram. Muitas pessoas me acusaram de loucura, pelo desastre que poderia ser. Foi difícil ouvir que poderia afundar o Tavares ou que o Tavares me poderia afundar o meu percurso. Nos primeiros meses de Tavares fui muito criticado por blogs e sites, mas dois anos e meio depois, o resultado está à vista. Foi ambicioso, perigoso até (risos) e quero deixar bem claro que ainda estou a muito pouco do que pretendo, nem que seja porque isto tem de durar. Apesar de eu fazer sempre tudo muito rápido, sempre vi o Tavares como um projecto a dez anos.

Já deste alguma volta de 180º no teu percurso?
Sim, quando entrei no mundo da cozinha. Também no dia em que me ia inscrever em Arquitectura e acabei por escolher Comunicação Empresarial.

Que não deixou de ser importante para a tua carreira…
Sim, porque foi um curso muito prático que me abriu muito os horizontes. O meu trabalho de fim de curso foi já ligado à gastronomia e foi no terceiro ano que decidi ser cozinheiro. Foi muito importante ter acabado e tal como me dizia uma pessoa importante no percurso da minha educação, ‘tudo o que se começa, acaba-se’, por isso também a minha vida ser feita de ciclos. Gosto de acabar tudo o que começo. Mesmo tendo decidido a mais de um ano de acabar o curso, que queria ir para cozinheiro foi importante ter terminado. A minha tese final foi um estudo de identidade e imagem da gastronomia portuguesa.

És uma pessoal frontal?
Não tanto como tu… (risos) Mais do que frontal, sou transparente.

Onde encontras os teus maiores momentos de liberdade?
São momentos muito curtos em termos de tempo, e são variados. Desde criar um prato com muita liberdade, a mergulhar no Guincho, ou mesmo desligar de tudo e estar com a minha família, a Sofia, o meu filho.

E qual o acto mais bravo da tua vida?
A minha própria vida. O meu pai morreu quando eu tinha sete anos e eu passei a ser o homem da casa. Há mais vidas difíceis do que fáceis, estas muito relativas. Considero muito importante conseguir lutar sempre pela felicidade e conseguir pôr para trás das costas algumas contrariedades que nos atiram abaixo. Para virar as costas a uma discussão é preciso mais coragem do que continuá-la e para saber perdoar também.

Quais os teus momentos mais ‘chivalry’?
A minha liberdade e os sonhos da minha vida. Tenho de aprender muito antes de ensinar, mas vejo a ideia da escola de cozinha como um sonho importante para Portugal. É uma missão.